Instituto Brasileiro de Estudos e Defesa das Relações de Consumo apresentou petição ao Cade nesta sexta (8) para tentar impedir a transação
Mesmo depois perder o prazo para ingressar como terceira parte interessada no processo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre a aquisição de 31,67% da BRF pela Marfrig, o Instituto Brasileiro de Estudos e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec) ainda tenta impedir a transação.
Em 24 de setembro, a Superintendência-Geral do Cade publicou o despacho no Diário Oficial da União (DOU) com o parecer aprovando o negócio. No entanto, o caso só transita em julgado em 15 dias, prazo que vence nesta segunda-feira. Até então ainda é possível interpor recursos para que o caso seja julgado no tribunal do órgão antitruste. Um conselheiro precisa avocar o caso para tal.
Com esse intuito, o Ibedec pediu na sexta-feira, em petição assinada pelo advogado Rodrigo Daniel dos Santos, que os conselheiros levem o caso para o tribunal do Cade e reprovem a transação. No documento, o instituto argumenta que a aquisição da participação acionária da BRF pela Marfrig poderia provocar barreiras no mercado de hambúrguer.
No entanto, esse não foi o entendimento da Superintendência-Geral do Cade após as informações prestadas pela Marfrig sobre o mercado de hambúrguer. No varejo, a participação das marcas da Marfrig é inexpressiva. A companhia de Marcos Molina já tinha uma parceria de fornecimento com a BRF, produzindo em sua unidade no município de Várzea Grande (MT) o hambúrguer para as marcas Sadia e Perdigão.
No segmento de hambúrguer, a líder de mercado no Brasil é a rival JBS, dona das marcas Friboi e Seara. De acordo com informações da consultoria Nielsen, a BRF tem 28,6% do mercado brasileiro de hambúrguer e a JBS, 35,5%.
A BRF vem perdendo participação no mercado de hambúrguer desde que deixou de contar com abatedouros de bovinos. Para quem conhece a indústria, a aposta é que a proximidade da Marfrig com a BRF poderia tornar a companhia mais competitiva em hambúrguer, acirrando a competição com a JBS, e não a enfraquecendo.
No mercado, atuação do Ibedec chamou atenção pelo histórico do instituto com a própria BRF no órgão antitruste. Em 2015, o Ibedec fez uma representação no Cade questionando o que considerava ser uma conduta anticompetitiva de Abilio Diniz ao adquirir uma participação no Carrefour ao mesmo tempo em que era acionista e presidente do conselho da BRF, fornecedora da rede varejista.
Após uma avaliação do pedido do Ibedec, a Superintendência-Geral do Cade recomendou, no mesmo ano, o arquivamento do caso, argumentando que o fato não levantava “preocupações alarmantes e evidentes o suficiente, em termos concorrenciais”.
Na atuação deste ano, contra a compra das ações da BRF pela Marfrig, o Ibedec perdeu o prazo de 15 dias para se habilitar como terceira parte interessada. O edital foi publicado no DOU em 2 de junho, e o prazo expirou em 17 de junho. O Idec solicitou o ingresso no caso em 20 de junho.
Em 31 de agosto, o instituto voltou à carga, argumentando que a Superintendência-Geral do órgão antitruste havia pedido mais informações sobre o mercado de hambúrguer, o que poderia significar a reabertura do prazo para o ingresso como terceira parte interessada. O Cade recusou novamente o pedido.
“Conforme se extrai da Lei e do Regimento interno do Cade, a emenda não tem o condão de modificar o ato apresentado e publicizado pelo edital, mas somente de complementar, corrigir ou aprofundar elementos necessários para a análise do Cade. Afinal, se assim não fosse, o correto não seria emendar o ato, mas sim arquivá-lo e determinar sua reapresentação”, argumentou Diogo Thomson de Andrade, superintendente-geral interino, no parecer.
No entendimento da Superintendência-Geral do Cade, o Ibedec também “não apresentou elementos concorrenciais que indiquem claramente algum potencial lesivo específico decorrente da presente operação. Apenas apresentou riscos concorrenciais genéricos, ao indicar meramente a possibilidade de fechamento de mercado derivado da oferta de carne e comercialização de alimentos processados (hambúrguer, almôndega e quibe), e, posteriormente, a necessidade de se apurar a concentração no mercado de hambúrguer, almôndega e quibe”.
Em manifestações ao Cade, o Ibedec também já sinalizou a possibilidade de judicializar o caso. Procurado pelo Valor, o Ibedec não respondeu. A reportagem tentou contato no celular do presidente da instituição, José Geraldo Tardim, que não atendeu.