Em alta entre consumidores e no foco de investimentos milionários das maiores empresas do mundo, a carne cultivada virou alvo de um projeto de lei (PL) apresentado pelo deputado Tião Medeiros (PP-PR), presidente da Comissão de Agricultura da Câmara.
A proposta (4616/2023) quer proibir a pesquisa privada, a produção, a reprodução, a importação, a exportação, o transporte e a comercialização de carne animal (bovina, suína, de aves e outras) cultivada em laboratório.
A proibição se estende a qualquer produto alimentício que conter esse tipo de carne, obtido por meio de técnicas de cultura celular ou sintética, em sua composição.
O texto prevê sanções, como o cancelamento do registro de empresas que investirem nesse segmento, apreensão e destruição dos produtos, embargo e interdição dos estabelecimentos, perda de incentivos fiscais e financiamentos, e multas que vão de R$ 1 milhão a R$ 10 milhões.
A proposta também quer acrescentar na lei brasileira da biotecnologia a previsão de pena de reclusão de três anos para quem pesquisar ou produzir carne cultivada. O projeto preserva as pesquisas públicas sobre o assunto desde que autorizadas por órgão competente.
Por que proibir?
Segundo a assessoria do deputado, a proposta “visa a proteger de forma rigorosa a pecuária nacional, um dos setores mais importantes da economia, responsável por 2% do PIB brasileiro”.
O parlamentar argumenta que, apelidado de “carne do futuro”, o produto chegou ao Brasil “a reboque de narrativas enganosas, as quais encobrem as verdadeiras intenções de desequilibrar o setor e promover uma concorrência desleal, por falta de regulamentação”.
Para Tião Medeiros, ao invés de uma “revolução alimentar”, a carne cultivada em laboratório pode representar uma ameaça a países com grandes rebanhos, como o Brasil. Ele também indica, na justificativa do projeto, que esses produtos podem gerar efeitos danosos à economia do país, ao meio ambiente e à saúde humana.
“Ainda há muitas incógnitas sobre os efeitos do consumo de carne cultivada a longo prazo. Embora promovida como uma alternativa, a carne cultivada pode conter hormônios, aditivos e outros componentes que ainda não foram totalmente estudados. O risco para a saúde pública é real e não deve ser ignorado”, avaliou o parlamentar.
No mundo
A movimentação não é exclusiva do Brasil. Outros países, como Itália e Uruguai também, discutem em instâncias governamentais a proibição do comércio e estudos envolvendo proteínas cultivadas em laboratório.
Ambos alegam que os efeitos dos produtos para a saúde humana ainda são desconhecidos e, portanto, não devem ser liberados antes que seus benefícios sejam comprovados cientificamente.
Por outro lado, nos Estados Unidos, duas empresas já possuem autorização para produzir carne de frango cultivada e podem expor seus produtos nas prateleiras dos supermercados americanos. Singapura foi o primeiro país a liberar as vendas.
O setor no Brasil
O segmento de proteínas alternativas tem recebido investimentos milionários nos últimos tempos. Principal empresa de proteína animal do mundo, a JBS anunciou recentemente o início das obras do JBS Biotech Innovation Center, o primeiro centro de pesquisa em proteína cultivada no Brasil.
Previsto para ser inaugurado no final de 2024, o empreendimento ficará localizado no parque de inovação Sapiens Parque, em Florianópolis (SC), e será o maior centro de pesquisa voltado para a biotecnologia dos alimentos no Brasil, segundo a multinacional. O investimento será de US$ 22 milhões.
No início de 2023, a Embrapa Suínos e Aves, sediada em Santa Catarina, divulgou que está estudando meios para desenvolver carne de frango cultivado em laboratório. A escolha da proteína se dá pelo alto consumo dos brasileiros e da existência do banco genético acessível, um facilitador no processo de pesquisa.
O objetivo é que os primeiros protótipos do produto sejam apresentados ainda este ano, para análises sensoriais e nutricionais.