Marfrig e BRF ainda não são uma empresa só — e pode ser que isso demore a acontecer —, mas os movimentos mais recentes mostram que a integração entre elas é cada vez maior. Executivos de ambas as companhias anunciaram ontem, em Paris — paralelamente ao Salon Internacional de l’Agroalimentaire, ou Sial, uma das maiores feiras de negócios da indústria de alimentos de origem animal do mundo —, que, a partir de agora, a Sadia, da BRF, será a marca que a Marfrig usará para ampliar suas exportações de carne bovina. Além disso, os cortes bovinos da Marfrig passarão a ter as marcas Sadia/Bassi e Perdigão/Montana no mercado brasileiro.
A Marfrig tem hoje o controle da BRF, com 51% de seu capital, e a mudança é mais um passo na busca por sinergia entre as duas empresas. A decisão complementa um primeiro movimento, de setembro deste ano, quando as companhias anunciaram uma união em suas principais marcas para crescer no mercado de carne bovina processada no Brasil. Com essa mudança, os hambúrgueres de carne nobre da Marfrig passaram a levar a marca Sadia/Bassi, e Perdigão/Montana tornou-se o rótulo da linha de processados bovinos da Perdigão, da BRF.
“Vamos estender essa junção de marcas para o segmento de cortes de carne bovina no Brasil a partir de novembro (…) Agora, globalmente, a Sadia passa a ser a marca de expansão no negócio bovinos do grupo Marfrig BRF”, disse Marcel Sacco, vice-presidente de marketing e novos negócios da BRF.
A Marfrig atua com diferentes marcas de bovinos no mundo, como GJ, Pampeano, Tacuarembó e Quickfood — as duas últimas, de cortes produzidos nas unidades de Uruguai e Argentina, respectivamente. A empresa continuará a usar essas marcas, mas a GJ, presente em 91 países, deve ser prioritariamente substituída, de forma gradual, ainda que não vá deixar de existir.
“Vamos colocar Sadia também por causa da força internacional da marca, da presença que ela já tem”, afirmou o executivo. Segundo ele, a marca é a preferida no segmento de alimentos no Brasil, a terceira na preferência na América Latina e a quinta no mercado halal, que segue os preceitos muçulmanos.
Assim, o grupo vai usar Sadia em novos mercados, e naqueles em que ele já utiliza outras marcas, se fará uma avaliação caso a caso, disse Miguel Gularte, CEO da BRF. Rui Mendonça, CEO de Marfrig para América do Sul, acrescentou que a “preferencial vai ser Sadia”.
Equipes “multiproteínas”
A sinergia entre as duas empresas também já é realidade na área comercial no exterior, que tem equipes de venda “multiproteínas”. Isso significa que todos os vendedores das duas empresas comercializam carnes bovina (produzida pela Marfrig), suína ou de frango, produzidas pela BRF. A BRF compartilha com a Marfrig seu escritório em Xangai, por exemplo, e a Marfrig faz a distribuição de produtos da BRF na Argentina e no Uruguai, segundo Alisson Navarro, diretor de exportações da Marfrig. “Todos os colaboradores vendem todas as proteínas “, resumiu.
Segundo a Marfrig, a escolha da Sadia como a marca de expansão das exportações de carne bovina também abre caminho para a empresa avançar no mercado halal do Oriente Médio. A marca chegou há 50 anos à região, onde já é referência em carne de frango.
O trabalho para disseminar o produto começou nos pontos de venda, disse Igor Marti, vice-presidente de Mercado Halal. “Estamos colocando a marca Sadia muito bem destacada no ponto de venda e apresentando o material de apoio para dizer ao consumidor que a marca em que ele confia no frango e nos vegetais” merece essa confiança também na carne vermelha, afirmou.
Ganhos de eficiência
Ao adotar a marca Sadia nos mercados de exportação, o grupo quer ganhar participação e ampliar suas margens. E, com a integração na área de vendas, na cadeia de suprimentos e nos serviços, as empresas visam, além disso, a ganhos de eficiência. Isso também já é realidade nas negociações de frete, segundo Gularte.
No modelo integrado nas vendas, conta o executivo, muitos clientes “multiproteína” compravam frango e suíno da BRF, mas carne bovina de outra empresa. “Hoje, ele [o cliente] compra as duas companhias”, relatou.
Gularte disse que a integração de portfólio é parte de um projeto que começou nas duas empresas no momento em que a Marfrig assumiu o controle da BRF. “Quando a Marfrig assumiu o controle, ela trouxe esse programa de cultura de performance, em que olhamos onde havia oportunidade de melhorar, de [avaliar se era possível] replicar em uma empresa o que já se fazia na outra”, afirmou.
Exemplo de “geração de valor”
Sobre os passos recentes, o fundador da Marfrig, Marcos Molina, disse que Marfrig e BRF têm buscado “os melhores resultados para cada uma” e adotado medidas que aprofundem a sinergia operacional e comercial.
Sobre uma eventual fusão entre as empresas, Molina afirmou que, “independentemente da forma societária, que não é uma preocupação e nem prioridade, elas já atuam com uma plataforma multiproteína em diversas geografias”.
Enquanto prepara os próximos atos da integração com a BRF — “ainda há muito por fazer”, disse o empresário —, Molina aguarda a decisão do órgão de concorrência do Uruguai sobre a venda ao Minerva de três ativos de bovinos que a Marfrig tem no país. As unidades estão no pacote de 16 plantas que a Marfrig vendeu ao Minerva em agosto de 2023 por R$ 7,5 bilhões.
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) autorizou a venda de 13 delas (11 no Brasil, uma no Chile e uma na Argentina), mas o órgão antitruste uruguaio barrou a transferência das três que ficam no país, e a Minerva entrou com recurso. Cerca de R$ 6 bilhões do negócio entrarão no caixa da Marfrig no dia 28 deste mês.