O conselho de administração da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) aprovou na sexta-feira (18/3) um projeto de reestruturação da estatal que pode gerar, no longo prazo, economia de R$ 315 milhões por ano com a redução de cargos e despesas e a centralização de processos. A medida ainda será avaliada pelos ministérios da Agricultura e da Economia e em assembleia geral.
A proposta altera o modelo de atuação da empresa com o setor privado, permite a ela participar de sociedades e quer elevar seus ganhos financeiros com novas parcerias. A medida não é o ponto de chegada da transformação que o governo pretende fazer na estatal, mas representa um passo importante na estratégia traçada pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Na presidência da empresa desde o fim de 2019, Celso Moretti está à frente da missão.
O projeto “Transforma Embrapa” foi criticado pelo sindicato dos servidores, que acusa a atual gestão de tentar privatizar a estatal. Funcionários e associações de pequenos produtores assinaram um manifesto contra a proposta, que chamaram de “pacote de maldades”, e protestaram, sem sucesso.
A nova estrutura aprovada elimina as atuais cinco secretarias existentes, cria uma diretoria dedicada a negócios, redistribui funções e enxuga cargos de gerentes, coordenadores e assessores da presidência. O objetivo é tornar o organograma mais “horizontal” e aproximar os diretores dos gestores vinculados a eles. Nas unidades descentralizadas, por enquanto, haverá redução apenas dos cargos de supervisão. Mudanças mais profundas serão analisadas a partir de junho. Essa reorganização inicial deve gerar corte de custos de R$ 14,7 milhões ao ano.
A curto prazo, a estatal busca uma economia de R$ 2 milhões anuais com a aplicação de metas de redução de despesas com água, luz, limpeza e conservação. Os gastos totais de despesas da sede são de R$ 15,6 milhões.
A Embrapa apontou a possibilidade de reduzir 839 cargos na área administrativa, como TI, gestão de pessoas e licitação. O potencial de economia, nesse caso, é de R$ 298,3 milhões ao ano. A ideia é centralizar processos e otimizar o quadro de funcionários. Cerca de 70% da meta seria alcançada em 15 anos com aposentadoria compulsória dos empregados, sem demissões.
Proventos
A relação com a iniciativa privada muda para não limitar os proventos da estatal apenas à cobrança de royalties das tecnologias que ela desenvolve. A Embrapa terá um novo modelo de Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT), que passará a ser externo e formado em associação com outras instituições de ciência e tecnologia. Atualmente, 25% da programação de pesquisas é feita em parceria com algum ente privado.
Na visão da atual diretoria, há um desajuste entre o risco e o retorno que a Embrapa assume na relação com o mercado. A análise é que o benefício da exploração comercial das pesquisas é baixo ou até inexistente em alguns casos.
O novo NIT terá os direitos de exploração de tecnologias geradas pela Embrapa e vai gerir os recursos produzidos pela empresa. A ideia é ter mais “autonomia e novas oportunidades de negócios”. O modelo permitirá à estatal participar de Sociedades de Propósito Específico (SPEs), e, assim, ela pode virar sócia das empresas privadas que comercializam seus produtos.
Os recursos recebidos pelo NIT serão reinvestidos na Embrapa para financiar pesquisas e dar mais independência orçamentária à estatal. O projeto de reestruturação segue para avaliação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e da Secretaria Especial de Produtividade e Competitividade do Ministério da Economia. Depois, deverão ser aprovadas mudanças no regimento da estatal em assembleia geral. Os ajustes nas diretorias começarão em maio.
Servidores falam em “privatização” e “desmonte”
Na semana passada, em videoconferência com os servidores, Celso Moretti frisou que a empresa “seguirá sendo pública”. O secretário de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação do Ministério da Agricultura e presidente do conselho de administração, Fernando Camargo, disse ao Valor que há muita “incompreensão e fantasmas” no tema. “Propusemos aquilo que uma organização moderna faz, centralizando o trabalho, evitando sombreamento de atividades, duplicidade e retrabalho. Isso melhora a gestão”.
O Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário (Sinpaf), contudo, chama a proposta de “desmonte” e “privatização”. Um manifesto assinado por mais de 40 entidades de pequenos produtores, ONGs e outras associações diz que não houve diálogo com a sociedade e critica o fato de a reestruturação ocorrer em fim de mandato do governo.