Segundo analistas, nem os importadores do país asiático estão entendendo a demora para a reabertura ao produto brasileiro
A cadeia da carne bovina está em alerta. Após a confirmação de dois casos atípicos da doença da “vaca louca” em Minas Gerais e Mato Grosso, as projeções iniciais eram de que a China voltaria a comprar do Brasil em duas semanas, no máximo, mas a suspensão já chega a 20 dias. O Ministério da Agricultura diz ter enviado todas as informações sanitárias que são necessárias, mas Pequim segue sem reabrir seu mercado.
“Nem mesmo os importadores chineses sabem o que está acontecendo”, afirma o analista Fernando Iglesias, da Safras & Mercado. Procurada pelo Valor, a Embaixada da China no Brasil não se pronunciou. Fontes da indústria também dizem não ter notícias sobre quando os embarques ao país asiático – que normalmente absorve cerca de 60% das exportações brasileiras – voltarão a fluir.
Para Lygia Pimentel, diretora da Agrifatto, o forte crescimento das exportações à China ocorrido no fim de agosto e também nos primeiros dias de setembro deixa uma pulga atrás da orelha. “É como se alguém já soubesse o que estava acontecendo”, diz.
Segundo a consultoria, a possibilidade mais crível é que os chineses estejam aproveitando o episódio para renegociar contratos e diminuir os preços de suas encomendas. A favor do Brasil, Iglesias lembra que os chineses não têm muitas alternativas de originação, uma vez que as ofertas de Austrália e Argentina estão limitadas. “Os Estados Unidos também não vão parar de abastecer o mercado interno para priorizar a China”, comenta.
Porém, sem ter o que fazer com o “boi China” por enquanto, a indústria brasileira reduziu as compras. Segundo o analista da Safras, não há outros destinos capazes de absorver a oferta. Além disso, vender esses produtos no mercado interno, fragilizado pela crise econômica, só faria derreter os preços da proteína, que estão elevados.
Até o momento, as cotações do boi gordo em São Paulo foram relativamente pouco afetadas pela trava chinesa quando comparadas com os efeitos do embargo anterior, ocorrido em 2019, também causado pela confirmação de um caso atípico de encefalopatia espongiforme bovina (EEB). Entre 4 de junho e esta quinta-feira (23/9), a cotação recuou 2,06%, a R$ 298,80, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP). Na paralisação anterior, que durou 13 dias, o recuo foi de 3,75%.
De acordo com a Safras & Mercado, no entanto, a queda em Mato Grosso passa de 7%. Os preços, que estavam entre R$ 300 e R$ 305 por arroba antes da suspensão, recuaram para a faixa entre R$ 280 e R$ 285. Em Goiás, a queda é de mais 4%, saindo de R$ 298/300 para R$ 285/290.
Iglesias considera setembro um mês perdido. Com a oferta de contêineres no mundo bastante limitada, levará um tempo até que os frigoríficos brasileiros se organizem e consigam normalizar a logística quando a liberação ocorrer.
Se a China voltar às compras até o fim desta sexta-feira, Iglesias acredita que o mercado deve arrumar a casa em outubro e pode entrar no último bimestre do ano pronto para buscar os patamares recordes de R$ 320 a R$ 330 por arroba em São Paulo.